terça-feira, 29 de julho de 2008

Faça Amor Não Faça Guerra - Cultura Hippie

Movimento Hippie

O movimento e cultura hippie nasceu e teve o seu maior desenvolvimento nos EUA. Foi um movimento de uma juventude rica e escolarizada que recusava a injustiças e desigualdades da sociedade americana, nomeadamente a segregação racial. Desconfiava do poder económico-militar e defendia os valores da natureza.
Na sua expressão mais radical, os jovens hippies abandonavam o conforto dos lares paternos e rumavam para as cidades, principalmente S. Francisco, para aí viver em comunidade com outros hippies; noutros casos estabeleceram-se em comunas rurais.
Dois valores defendidos eram a "paz" e o "amor". Opunham-se a todas as guerras, incluindo a que o seu próprio país travava no Vietname. Defendiam o "amor livre", quer no sentido de "amar o próximo", quer no de praticar uma actividade sexual bastante libertária. Podia-se partilhar tudo, desde a comida aos companheiros. A palavra de ordem que melhor resume este sentimento foi a famosa "Make Love Not War".
Os hippies apreciavam a "filosofia oriental", o que significava alguns aspectos da religião hindu misturada com doutrina da "não violência" de Gandi. Numa das acções mais espectaculares (e mais ridículas) um numeroso grupo de hippies rodeou o Pentágono (sede do aparelho militar americano) e tentou fazê-lo levitar com apenas com a "força da meditação".
Estabeleceu-se um "estilo hippie", com roupas coloridas, túnicas, sandálias, cabelos compridos em ambos os sexos. A flor foi um dos seus símbolos e chegou a usar-se a expressão "flower power" como designação do movimento. Uma das canções-hino do movimento, S. Francisco, aconselhava aqueles que rumavam à cidade dos hippies: "Be sure to wear some flowers in your hair" (não te esqueças de usar algumas flores no teu cabelo). O "símbolo da paz" (com origem em Inglaterra, nos anos 50, no seio do movimento para o desarmamento) tornou-se igualmente no símbolo hippie:
Outro aspecto valorizado era o uso de drogas, o que foi facilitado pelo surgimento de drogas químicas, tais como o LSD, que no início não foi considerado perigoso nem de uso interdito. Os hippies alegavam que as drogas ajudavam a "abrir a mente".
A música pop, com as suas baladas melodiosas, e a música rock com os seus ritmos frenéticos, constituiram um meio poderoso para expressão da filosofia hippie. Escrita sob o efeito de drogas e ouvida nas mesmas circuntâncias, julgava-se que a música tinha um efeito libertador da mente. O adjectivo "psicadélico" foi utilizado para a caracterizar.
Também houve um design "psicodélico", de cartazes coloridos, com letras fluidas e deformadas que pareciam reproduzir a deformação e alongamento de imagens que ocorre sob o efeito de certas drogas. Com o mesmo objectivo eram usados desenhos caleidoscópicos.
Timothy Leary, um professor universitário que advogava (e praticava) o uso de drogas alucinogénicas como forma de "libertar a mente", tornou-se no principal "guia espiritual" do movimento hippie; criou o slogan "Turn On, Tune In, Drop Out" que resumia os principais aspectos da "contra-cultura" dos hippies:
-"Turn on" (literalmente "ligar", como em "ligar a luz") significava, na linguagem hippie, "tomar drogas", "ligando a mente" a uma dimensão de maior liberdade;
-"Tune in" (literalmente "sintonizaar") tinha o significado de aderir ao estilo e filosofia de vida hippie;
-"Drop out" (literalmente "sair", ""abandonar") significava abandonar o estilo de vida tradicional, sair do seio familiar, abandonar as espectativas de uma carreira profissional estável e emprego rotineiro; significava também a recusa de participação na guerra do Vietname (ou qualquer outra).

Antecedentes
As raizes do movimento Hippie podem ser detectadas desde os anos 40, após os final da II Guerra Mundial: após um período de 30 anos com duas guerras altamente destrutivas e uma prolongada depressão económica, começaram a despontar sinais de uma contracultura, contestatária do sistema. Ironicamente, esta contestação começava no país que menos tinha sofrido com a guerra e num período em que a economia estava lançada na recuperação.
Após a guerra a população americana resceu enormemente: fenómeno conhecido como "baby-boom". Entre 1946 e 1964 o número de estudantes no liceu (college) duplicou. Em 1968, 50% de todos os jovens de 18 e 19 ano frequentavam o liceu, números que mostram o seu potencial impacto na vida em sociedade.
O poeta Allen Ginsberg pode ser considerado como um dos progenitores deste movimento. As palavras escritas foram usadas para exprimir a sua frustação, protestanto contra aquilo que consideravam estar errado no mundo, tendo ficado conhecidos como a "Geração Beat".
Nos anos 50 o movimento crescera e expandira-se. Nos café e clubes de jazz juntavam-se para conversar e declamar poesia. Foi destes espaços que emergiram os "Beatniks", caracteristicamente vestidoscom roupas informais (shabby), os homens de barba, usando óculos escuros a qualquer hora do dia. Usavam frequentemente a expressão "I'm hip". Dizia-se que o seu modo de se expressar era "hip", e avia quem lhe chamasse "Hipsters", e a expressão evoluíu até aos "Hippies".
Foram os hippies que trouxeram o movimento dos cafés para os campus universitários, e a universidade de Berkley tornou-se seu centro. Um momento crucial ocorreu ali em 1964, com "Free Speech Movement" (Movimento pela Liberdade de Expressão). A reitoria proibiu a distribuição de material d eprotesto fora dos portões da universidade. Perante a recusa dos estudantes foi chamada a polícia. A decisão de levantar processos aos estudantes levou-os a ocupar o edifíco da Reitoria. Em Março de 1965 os estudantes da Universidade de Michigan levaram a cabo a primeira acção com o objectivo de mostrar que a guerra do Vietname era imoral e que os EUA a deveriam abandonar.
O movimento estudantil contestava injustiças sociais tais como o racismo, a pobreza, inferioridade direitos das mulheres. A guerra do Vietname começou gradualmente a ser contestada. Os protestos e manifestações tornaram-se frequentes, por vezes em confrontação com a polícia. Os incidentes mais grave ocorreram na Universidade de Kent, onde a Guarda Nacional disparou sobre manifestantes, matando quatro estudantes. Música
A música teve um papel muito importante no desenvolvimento da cultura hippie. Inicialmente foi nas fileiras da "folk music" que as ideias de contestatárias começaram a tomar forma. A AMérica tinha uma grande tradição de cantores contestatários, como Woody Guthrie, o qual, durante a Grande Depressão dos anos 30 tinha percorrido a américa profunda cantando canções de protesto e de apelo à luta sindical. Na nova geração esta corrente contestatária foi prosseguida por cantores como Pete Seeger, Joan Baez e Bob Dylan
Festivais e música, como o Festival de Newport, atraía muitos jovens que procuravam não só o divertimento musical mas igualmente o debate de ideias. Estes Festivais começaram a crescer em dimensão e chegaram a ser proibidos em alguns sítios.
Bob Dylan, um jovem cantor do Midwest americano, com cara de miudo, compôs a canção "Blowing in the wind", que viria a ser considerada como um dos hinos do movimento contestatário. Anos mais tarde o próprio Dylan admitiria que a música era apenas uma adaptação de uma balada irlandesa, mas as palavras sintetizavam poderosamente o sentimento contestatário da época:
How many roads must a man walk down / Before you call him a man?Yes, 'n' how many seas must a white dove sail / Before she sleeps in the sand? Yes, 'n' how many times must the cannon balls fly / Before they're forever banned?
A resposta, dada no refrão, era ao mesmo tempo ingénua e convincente:
The answer, my friend, is blowin' in the wind
Querendo dizer que as justiças eram evidentes para todos e que todos acabariam por ter consciência delas. Esse era o sentimento da época: havia demasiadas injustiças, mas em breve todos o compreenderiam.
Também o uso de drogas começou a acompanhar a cultura hippie. O uso de drogas estivera associado, durante décadas, ao mundo artístico musical, mas agora iria espalhar-se entre as audiências como fazendo parte do "modo de ser" contestatário dos hippies. A inovação da tecnologia,que se espelhava na industria química e farmaceutica, haveria de ajudar a desenvolver o consumo de drogas, tanto mais que algumas foram inicialmente consideradas como "inofensivas". Entra o rock em cena
Ao mesmo tempo que as suaves baladas e hinos dos músicos folk traduziam a crítica social dos meios universitários, um outro tipo de música, mais ritmada e mais ruidosa, preparava-se para conquistar a preferência dos jovens. Pequenos grupos equipados com guitarras eléctricas e bateria começaram a nascer na Grã Bretanha. Um deles tomou rapidamente a dianteira, os Beatles que, curiosamente, continham no nome o mesma palavra "beat": Beatles é uma espécie de trocadilho a partir da palavra beetle (bezouro), modificada para acentuar a ideia de música sincopada (sinónimo significa batida, ou ritmo).
Embora cantando temas pouco críticos, essencialmente dedicados aos encontros e desencontros de amor (Love me do, I wanna hold your hand, She loves you) estas músicas adquiriram grande popularidade entre os jovens. Um outro grupo inglês, formado quase ao mesmo tempo dos Beatles, os Roling Stones, embora cantando o mesmo tipo de temas, começou a manifestar nas suas canções um pouco mais de irreverência e ousadia. "Let's spend a night together" (vamos passar a noite juntos) aparentemente apenas manifestava o interesse de duas pessoas em estarem "juntas", nada de proibido, mas subentendia uma actividade amorosa mais empenhada. A canção "Satisfaction", embora centrada na temática amorosa ("não consigo satisfação") acabava por simbolizar o sentimento geral da jovem geração. Os ritmos e harmonização de vozes dos Rolling Stones, mais agressivos que os doces coros dos Beatles, antecipava igualmente um estilo de música menos adocicado.
Estas tendências - as palavras críticas da música folk e o ritmo e agressividade musical do pop inglês - acabariam inevitavelmente por se juntar no que veio a ficar conhecido como "música rock". Mas existe um facto que simboliza bem esse encontro: a visita de Bob Dylan a Inglaterra em 1965, para uma série de concertos, a qual deu origem a um documentário hoje famoso: " Don't look back", realizado por D. A. Pennebaker. Numa das cenas Bob Dylan (que como qualquer músico de folk se acompanhava a si próprio apenas com guitarra acústica) detém-se por momentos frente a uma montra londrina com guitarras eléctricas, visivelmente impressionado. Numa outra cena, nos bastidores de um teatro antes de um concerto, ensaia num piano os acordes de uma nova canção. Poucos meses depois aquela mesma canção, acompanhada por uma poderosa banda "eléctrica", haveria de provocar uma revolução musical: tratava-se de "Like a Rolling Stone" e continha a receita para o novo rock: palavras críticas, agressivas, um som ruidoso e fortemente ritmado, uma forma de cantar "feia", por comparação com as suaves vozes do folk ou as doces harmonias do pop.
Os Beatles fariam logo de seguida o album "Revolver", também com canções mais empenhadas na crítica social, o que levaria Dylan a dizer-lhes, quando os voltou a encontrar: "Oh, I get it, you don't really want to be cute anymore." ("Estou a ver que já não querem continuar a ser bem-educadinhos"). O albém incluía as cançõpes "Here, There and Everywhere," "Eleanor Rigby" e "For No One," e terminava coma canção experimental de um só acorde "Tomorrow Never Knows," imbuída de uma filosofia oriental.
Festival de Woodstock

Ainda hoje se debate sobre qual a verdadeira importância do Festival de Woodstock. Os "crentes" acham que foi uma pedra angular do movimento da humanidade rumo a um mundo melhor. Os cínicos afirmam que foi um acontecimento ridículo que pôs fim a uma era de ingenuidade. E há aqueles que simpesmente acham que foi apenas uma "festa dos diabos".
A "Woodstock Music and Art Fair" de 1969 arrastou mais de 450 mil pessoas para um descampado não muito distante de Nova Iorque. Durante quatro dias o sítio transformou-se numa contra-cultura de "mentes abertas", onde as drogas eram "legais" e o amor era "livre". Este tipo de concertos era por esta altura frequente em muitas zonas dos Estados Unidos. O que tornou Woodstock diferente e o transformou no símbolo da contracultura hippie e rock foram duas coisas: por um lado o concerto arrastou um inesperado número de espectadores, originando gigantescos engarrafamentos de trânsito levando as autoridades a declarar o estado de emergência, contribuindo para atrair as atenções do país. Por outro lado, o concerto foi coberto por uma equipa de filmagem dirigida por Michael Wadleigh, dando origem ao documentário "Woodstock" que permitiu corporizar em imagens duradouras a iconogafia hippie e a contra-cultura rock. Podem aplicar-se a este evento as palavras de Dickens: "Foram os melhores tempos. Foram os piores tempos. Foi uma amálgama que não se voltará a repetir".

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